sexta-feira, 19 de novembro de 2010

O TEMPO - Santo Agostinho


No livro Confissões lançou esta questão: "Que é, pois o tempo"? (XIV, 17). Ele vê na sucessão temporal uma marca da impotência humana, da miséria do ser racional diante do infinito poder do Ser Supremo. O caráter instintivo do conheci­mento humano do tempo mostra bem os limites de sua noção so­bre este assunto. Trata-se de algo muito familiar, dado que cada um vive no tempo, mas que, vertiginosamente, lhe escapa. O tempo resiste a uma explicação porque é inconcebível. Ele inscreve sua es­sência na fuga. Ninguém, a não ser Deus, o pode compreender e árduo é para o homem tentar conceitualizá-lo. Intuí-lo é o máximo que está ao alcance da inteligência. Cumpre, porém, tentar captar qual é a qüididade desta intuição. É preciso, antes de tudo, retornar à distinção entre o passado, o presente e o futuro. Aí surge de ime­diato um impasse, pois o passado não é, dado que não está presen­te. Assim também o futuro, uma vez que não existe ainda, é prová­vel. Resta o presente que flui, contudo, inexoravelmente. Os latinos diziam: Fugit irreparabile tempus - foge o irreparável tempo, como bem se expressou Virgílio (Geórgicas III, 284). O presente é algo real que não se estabiliza nunca. Deste modo, o movimento caracteriza o tempo, é seu modo de ser. Por isto, das coisas e dos seres vivos que lhe estão submissos se diz que tudo é contingente: existe, po­deria não existir e tende a desaparecer. Tudo que começa propende a acabar. O que nasce está fadado a perecer. Este aspecto Agostinho assim o sintetizou na Cidade de Deus: "O tempo que se vive dimi­nui a própria vida e não passa de uma trajetória para a morte; com efeito, todo ser vivo está fadado a morrer, dado que, desde a ori­gem, a morte atenta contra sua vida. Daí sua assertiva em Confis­sões: "Podemos afirmar que o tempo é o que tende a não mais ser" (XI, 14). Como o tempo é um movimento perpétuo, cumpre distin­gui-lo da eternidade. São dois opostos. Um se contrapõe ao outro como a instabilidade à constância. A eternidade é estática, imutável, estável. A eternidade não conhece nem princípio, nem fim, ao passo que o tempo não cessa de começar e de acabar. Miséria do homem que está imerso no tempo; grandeza de Deus que existe desde toda a eternidade. A Moisés Ele afirmou: "Eu sou aquele que é" (Ex 3,14).

Eis o que então diz Agostinho ao Ser Supremo: "Os vossos anos são tomo um só dia, e o vosso dia não se repete de modo que possa chamar-se cotidiano, mas é um perpétuo "hoje", porque este vosso "hoje" é a eternidade" (XIII, 15) O ser racional vive um presente mutável, fugaz, ininterruptamente incerto, eternamente irreversível. O não-ser do tempo chancela a limitação humana. A humanidade vive a inconstância temporal. Donde a eventualidade que cerca quem existe. O tempo escapa inteiramente à jurisdição do animal racional por causa de seu irreversível dinamismo que o faz irredutível. Tal é a condição humana: somos corruptíveis e finitos e somente Deus é eterno. Segundo Santo Agostinho, porém, pela memória, de certo modo, se supera o tempo, dado que pela lembrança do passado se pode ir contra a corrente do movimento temporal. Trata-se de se trazer o passado para o presente e, até mesmo, se pode fazer uma previsão com relação ao futuro. Daí Agostinho falar do "presente do passado", do "presente do presente" e do "presente do futuro". A memória como que retém o tempo, eternizando, de certo modo, o instante vivido e antecipando o porvir. Agostinho exalta, portan­to, o poder da memória sem a qual nada se poderia imaginar nem conhecer, compreender ou apreender. Diz ele: "O pretérito longo outra coisa não é senão a longa lembrança do passado"(XI,28).. O homem que possui a memória detém a capacidade de criar sua pró­pria duração interior, que é uma equivalência de tempo, da qual ele é o senhor. A reminiscência faz existir o passado no presente e, pela projeção, até mesmo o futuro. Trata-se de uma atividade do espírito que transcende o tempo. Tudo isto infunde um otimismo antropo­lógico de grandes proporções. O homem, de fato, finito, limitado, possuindo uma alma espiritual, participa, assim, do próprio eterno "hoje" de Deus! O tempo torna-se um sinal de eternidade.

ATUALIDADE DE SANTO AGOSTINHO
Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho-Professor no Seminário de Mariana – MG

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

domingo, 14 de novembro de 2010

Moral e Ética



A confusão que acontece entre as palavras Moral e Ética existem há muitos séculos. A própria etimologia destes termos gera confusão, sendo que Ética vem do grego “ethos” que significa modo de ser, e Moral tem sua origem no latim, que vem de “mores”, significando costumes.

Esta confusão pode ser resolvida com o esclarecimento dos dois temas, sendo que Moral é um conjunto de normas que regulam o comportamento do homem em sociedade, e estas normas são adquiridas pela educação, pela tradição e pelo cotidiano. Durkheim explicava Moral como a “ciência dos costumes”, sendo algo anterior a própria sociedade. A Moral tem caráter obrigatório.

Já a palavra Ética, Motta (1984) defini como um “conjunto de valores que orientam o comportamento do homem em relação aos outros homens na sociedade em que vive, garantindo, outrossim, o bem-estar social”, ou seja, Ética é a forma que o homem deve se comportar no seu meio social.

A Moral sempre existiu, pois todo ser humano possui a consciência Moral que o leva a distinguir o bem do mal no contexto em que vive. Surgindo realmente quando o homem passou a fazer parte de agrupamentos, isto é, surgiu nas sociedades primitivas, nas primeiras tribos. A Ética teria surgido com Sócrates, pois se exigi maior grau de cultura. Ela investiga e explica as normas morais, pois leva o homem a agir não só por tradição, educação ou hábito, mas principalmente por convicção e inteligência. Vásquez (1998) aponta que a Ética é teórica e reflexiva, enquanto a Moral é eminentemente prática. Uma completa a outra, havendo um inter-relacionamento entre ambas, pois na ação humana, o conhecer e o agir são indissociáveis.

Em nome da amizade, deve-se guardar silêncio diante do ato de um traidor? Em situações como esta, os indivíduos se deparam com a necessidade de organizar o seu comportamento por normas que se julgam mais apropriadas ou mais dignas de ser cumpridas. Tais normas são aceitas como obrigatórias, e desta forma, as pessoas compreendem que têm o dever de agir desta ou daquela maneira. Porém o comportamento é o resultado de normas já estabelecidas, não sendo, então, uma decisão natural, pois todo comportamento sofrerá um julgamento. E a diferença prática entre Moral e Ética é que esta é o juiz das morais, assim Ética é uma espécie de legislação do comportamento Moral das pessoas. Mas a função fundamental é a mesma de toda teoria: explorar, esclarecer ou investigar uma determinada realidade.

A Moral, afinal, não é somente um ato individual, pois as pessoas são, por natureza, seres sociais, assim percebe-se que a Moral também é um empreendimento social. E esses atos morais, quando realizados por livre participação da pessoa, são aceitas, voluntariamente.

Pois assim determina Vasquez (1998) ao citar Moral como um “sistema de normas, princípios e valores, segundo o qual são regulamentadas as relações mútuas entre os indivíduos ou entre estes e a comunidade, de tal maneira que estas normas, dotadas de um caráter histórico e social, sejam acatadas livres e conscientemente, por uma convicção íntima, e não de uma maneira mecânica, externa ou impessoal”.

Enfim, Ética e Moral são os maiores valores do homem livre. Ambos significam "respeitar e venerar a vida". O homem, com seu livre arbítrio, vai formando seu meio ambiente ou o destruindo, ou ele apóia a natureza e suas criaturas ou ele subjuga tudo que pode dominar, e assim ele mesmo se torna no bem ou no mal deste planeta. Deste modo, Ética e a Moral se formam numa mesma realidade.

Autoria: THIAGO FIRMINO SILVANO - Acadêmico do Curso de Direito da UNISUL

REFERÊNCIA

1 SILVA, José Cândido da; SUNG, Jung Mo. Conversando sobre ética e sociedade. 7. ed. Petrópolis: Vozes, 2000.

2 CAMARGO, Marculino. Fundamentos da ética geral e profissional. 3. ed. Petrópolis: Vozes, 1999.

3 VÁSQUEZ, Adolfo Sánchez. Ética. 18. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.

4 GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução à Ciência do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 1972.

5 VENOSA, Sílvio de Salvo. Introdução ao Estudo do Direito. São Paulo: Atlas, 2004.

6 MOTTA, Nair de Souza. Ética e vida profissional. Rio de Janeiro: Âmbito Cultural, 1984.


Veja também:

Ética, Moral e Direito

Ética da Diversidade

Ética e Ciência

Ética na política brasileira

quinta-feira, 4 de novembro de 2010


"...o homem bom é estimável e desejável para o homem bom. Ora, dir-se-ia que o amor é um sentimento e a amizade é uma disposição de caráter, porque se pode sentir amor mesmo pelas coisas inanimadas, mas o amor mútuo envolve escolha, e a escolha procede de uma disposição de caráter. E os homens desejam bem àqueles a quem amam por eles mesmos, não por efeito de um sentimento, mas de uma disposição de caráter. E finalmente, os que amam um amigo amam o que é bom para eles mesmos; porque o homem bom, ao tornar-se amigo, passa a ser um bem para o seu amigo. Cada qual, portanto, ao mesmo tempo em que ama o que é bom para ele, retribui com benevolência e aprazibilidade em igualdade de termos; porque se diz que amizade é igualdade, e ambas são encontradas mais comumente na amizade dos bons."
(Ética a Nicômaco - Livros VIII e IX - Aristóteles)