A menina jazia na cama, incomunicável, murmurando grunhidos, uma febre que não passava.
Sua mãe não sabia que atitude tomar, já havia recorrido a todas as portas.
Corria o ano 31 AD, a região de Tiro e Sidom era castigada pela seca, o povo fenício, antes exaltado
por sua avançada ciência e pela reconhecido mérito dos avanços na escrita, jazia agora mergulhado
na inércia cultural, gerada pela idolatria dominante e por governos corruptos.
A mãe ainda recorda os últimos dias em que sua filhinha ainda se portava
como uma criança normal, que não se cansava de correr e brincar com aquele animalzinho intruso
Viúva já a alguns anos, se esforçava por pelo menos alimentar e vestir sua única filha, ma já não
era capaz de expressar seu amor, em pequenos gestos , em ouvir e escutar.
Não foi capaz de perceber que aquele cachorrinho era uma fuga, uma medicina que uma criança
encontrava pra tanta falta de atenção. Pro olhar sempre duro e reprovador da mãe, amargada pela
falta de esperança e pelo fanatismo de tentar servir e agradar a religião, a seus ídolos de pedra e barro
que ironicamente, não tinham e nem poderiam "ter coração".
Sim, naquele dia fatídico, ela viu tudo mudar, mais uma vez, foi rude,
abrupta, e "estourou" com a criança, aos gritos, lhe chamou de invalida, imprestável, e disse
que sumisse com aquele cachorro: ...." Como podes?! "
não temos o que comer e trazes um cão para dentro de casa?? Suma,
desapareça com esse animal!!..."
A criança aos prantos dizia. “mamãe, não necessitas dar a ele de comer, eu tiro de minha comida..."
...."Louca!!!! não e' justo tirar de um filho e der de comer a um cachorro !!!! ..."
A criança aos prantos, soluçou... "mas ele pode comer das migalhas que caem
de nossa mesa.."
..."Chega!!! Não fales mais, suma com esse lixo... Fora daqui com ele!!! "
A pobre criança levou seu cachorrinho e soluçando o amarrou a uma arvore na floresta, voltou para casa e
desde então a estranha febre a acometeu, e parecia estar agora, sempre prostrada, num outro mundo,
incomunicável.
A mãe desesperada, recorreu aos ídolos, buscou seus sacerdotes, a palavra foi de morte:
...." a menina tem um espírito maligno, esta e' a vontade de Baal, ela
morrera'..."
Sentada `a porta, naquela manhã de domingo, o sol já nascera e a pobre viúva abatida não se dava
conta , a imensa tristeza lhe impedia até mesmo de diferenciar o dia e a noite.
Um velho vizinho se aproximou, trazia alguns pães e um pouco de azeite: ..."amiga, amiga, somente um milagre
poderia lhe ajudar, ah se nossos ídolos realmente funcionassem, realmente fizesse algo por nosso povo.."
dizem que ha' um homem de Israel por aqui nesses dias e que os deuses operam milagres por meio dele, mas
você sabe , e' um outro povo e cada povo tem o mestre que merece.
Aquela mulher subitamente elevou sua fronte, tudo o que ela ouviu foi a palavra "milagres". Algo passou a
lhe impulsionar no espírito, ela precisava de algo mais, buscar o "invisitado".
Pediu ao amigo e sua esposa que cuidassem da filhinha, partiu caminhando , as pernas cansadas e vitimas
da idade tentavam desistir mas seu espírito estava decidido, ela tinha de tinha de encontrar o Fazedor de milagres.
A tarde já findava quando finalmente se aproximou da casa onde Ele estava ,
as indicações e informações respondidas todas diziam que ali estava Ele naquele dia.
Dois homens conversavam na porta, a velha mulher se aproximou : ... " senhores, por favor , lhes imploro,
necessito ver o Mestre dos milagres, disseram que se encontra nessa casa"...
Os dois homens ficaram pensativos.. aquela mulher parecia realmente desesperada... mas e esse sotaque estranho?
com certeza ela não era da nação de Israel, o mais velho respondeu:
"Senhora, somos discípulos do mestre a quem procuras, seu nome é Jesus Cristo, e mais do que um Mestre, Ele
é um messias, mas.. aham... Um messias para o povo de Israel. "
A velha viúva sentiu o teor daquelas palavras, mas não importava, mais forte era seu desejo, era conhecer o tal
Mestre de amor, que jamais havia negado sua ajuda e a ninguém havia lançado fora.
"Por favor, eu suplico, tenho um caso de vida ou morte, necessito ver o Mestre..."
O mais velho já se propunha a fazê-la desistir e acompanhá-la até a saída da vila, mas o mais jovem discípulo já
estava decidido, levaria a senhora até o Mestre. Num "atrevimento" santo típico dos jovens, decidiu que não
havia mal algum em levar aquela senhora até Ele.
Ela se aproximou, oprimida, mais pelo peso da dor que pelo peso do cansaço:
".. Mestre, suplico-lhe, minha filha tem um demônio, e jaz inconsciente numa cama..."
Jesus a mirou com um olhar terno, porem firme, alguns breves segundos se passaram, o silencio desafiava os
discípulos ali presentes a adivinhar qual seria a reação do Mestre:
Com serenidade e firmeza, o Mestre lhe respondeu:
...."não é justo tirar o pão dos filhinhos e dar aos cachorrinhos.."
Aquela frase foi como um raio , caindo fulminante em seu coração, a mulher finalmente caia em si, todo
o sofrimento, toda a dor provocados pela pura e simples falta de amor.
Numa reação rápida e urgente, a mulher retrucou:
".... Mas os cachorrinhos podem comer das migalhas que caem da mesa dos filhos... "
Jesus a mirou com amor, um quase imperceptível sorriso nos lábios:
“ Oh mulher, grande e' sua fé, vá, a sua filha está curada.."
Quantas vezes nos esquecemos que mais que cumprir rituais, mais que
obedecer leis e dogmas, o que mais anseia Deus é ver em nos o dom
do amor? . Não foi Ele quem disse:..." nisso reconhecerão que vocês são
meus discípulos, se vocês amarem uns aos outros".?
De nada adianta ter a fé de um profeta ou patriarca ,de nada adianta
realizar milagres, mas ao mesmo tempo tratar mal as pessoas, humilhar "servos alheios" , pisar em
seu semelhante, colocar a "obra" acima do ser humano ao ponto de quase que se oficializar que
"sentimentos" é algo para os fracos, ou algo maligno.
Ainda bem que está escrito que Jesus chorou, que sentiu compaixão tantas vezes,
que se alegrou e exultou e que até mesmo a um jovem rico , que preferiu todas
as suas riquezas ao invés de segui-lo, Ele "amou profundamente".
A Fé é eficaz quando usada sem sentimentos, como uma ferramenta, isso é comprovado
por fatos e inúmeros testemunhos de hoje e do passado. Mas no dia a dia, no relacionar-se com as pessoas,
o Amor, o cuidado, o carinho e afeição , SENTIMENTOS tem de ser cultivados.
A viúva sirio-fenicia , como muitos de nos' nos dias de hoje, tinha o dom da Fé, fez uso de sua Fé, tirou forcas dela para
passar barreiras, obstáculos e até mesmo decepções e ofensas por parte
daqueles que seguiam a Jesus, em busca de seu milagre , em busca do Mestre Jesus .
Mas faltava a ela o principal, a força maior que traz a felicidade e realização de pessoas, famílias e igrejas.
faltava o dom maior, o Amor
Mãe e filha agora começavam de novo, uma nova caminhada de amor e uma nova fé.
prosperidade, bênçãos, três seres debaixo da sombra de um Deus de amor.
Três?
Ah.. Esqueci de dizer, o cachorrinho misteriosamente esperava a velha viúva na porta quando ela regressou.
Ray Evangelista
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